De carona com ninguém
Blogs e Colunas | Amanda Neuman 13/04/2025 19h39 - Atualizado em 13/04/2025 19h47Outro dia, saí pra dirigir sem rumo. Era fim de tarde, eu tinha entregue tudo o que precisava no trabalho, minha filha estava na casa da avó e eu, ao invés de aproveitar o silêncio pra descansar, senti vontade de sair. Não pra chegar em algum lugar, mas pra sentir que eu estava no comando.
E é curioso pensar que dirigir, hoje, é uma das coisas que mais me dão prazer. Porque, por muito tempo, foi exatamente o contrário. Eu tinha um medo enorme, daqueles que paralisam. A ideia de estar sozinha no carro, com a responsabilidade de guiar, de reagir, de decidir rápido, me fazia evitar. Adiei habilitação, fugi da prática, inventei desculpas. Precisei de terapia pra enfrentar isso e foi um processo longo. Dirigir, pra mim, foi o primeiro grande símbolo do que significa enfrentar o que assusta e seguir mesmo com medo.
Hoje, quando estou ao volante, o que sinto não é controle absoluto, é confiança. Tenho a sensação de estar em movimento por escolha própria. Daí, então, sinto que transborda da direção para a vida.
Lembrei de uma frase da Shonda Rhimes - uma das mulheres que mais admiro - que me atravessa sempre que penso nas minhas decisões: “Algumas vezes as pessoas não querem se empoderar porque têm medo de serem as responsáveis por tomar as decisões.”
É isso. Nem todo mundo quer dirigir — literal e metaforicamente. Tem gente que prefere o banco do carona. Creio que nem sempre é por preguiça, mas por medo de errar o caminho. Medo de assumir que se perdeu por conta própria. Medo de arcar com as curvas que escolheu.
Eu mesma já estive ali, muitas vezes. Aceitei trabalhos que não faziam muito sentido porque era mais fácil continuar do que encarar o desconforto de sair. Evitei conversas importantes porque não queria lidar com as consequências. Fiz escolhas que agradavam aos outros e, silenciosamente, me anulavam. Fiz muita coisa achando que estava sendo prudente, madura, sensata.
Mas chega uma hora em que a vida te olha com uma calma imensa e diz: ou você dirige, ou vai continuar rodando em círculos, reclamando dos caminhos que os outros escolhem por você. Foi assim que comecei a tomar as rédeas. Não em grandes gestos, mas nas pequenas decisões: assumir o que me serve, sair de onde não me cabe, trabalhar por conta própria porque eu queria mais (mais tempo, mais liberdade, mais valorização).
A vida, como o trânsito, nem sempre flui fácil. Às vezes tem congestionamento, buraco, retorno que você não viu a tempo e passou direto. Porém, quando sou eu que estou com as mãos no volante, até o trajeto mais torto faz sentido. É claro que há dias em que dá vontade de passar a direção pra alguém, só por uns minutos, dizer assim: “Escolhe aí, eu só vou olhando a paisagem.” Mas já aprendi e não insisto mais: olhar a paisagem só tem gosto bom quando fui eu quem escolheu a estrada.
Sigo. Com calma. Até com dúvidas. Sempre com coragem. Mais do que acertar sempre, o que eu quero mesmo é continuar sendo a pessoa que dirige, a que escolhe o caminho e segura o volante.
E pensar que, por tanto tempo, eu tive medo disso.







Jornalista (UNIT) há 10 anos, mestra em Comunicação (UFS), doutoranda em Sociologia (UFS), pesquisadora na área de redes sociais e influenciadores digitais, e mentora de marketing para empreendedores e Influenciadores. Na internet, como mulher plus size que descobriu o amor próprio e auto estima além dos padrões, compartilha sua vida e vivências com outras mulheres e as encoraja a se amarem como são.
E-mail: amandaneuman.an@gmail.com
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