A coluna desta semana manda tudo pro espaço | Levando a Série | F5 News - Sergipe Atualizado

A coluna desta semana manda tudo pro espaço
‘Distante’ e ‘Jornada nas Estrelas’ elevam a ficção científica a outro patamar
Blogs e Colunas | Levando a Série 26/02/2021 16h00 - Atualizado em 26/02/2021 18h01

Fevereiro de 2021 já entrou gloriosamente para a história da Astronáutica, campo da Ciência que se dedica à exploração espacial. Nada menos que três países chegaram neste mês a Marte, o chamado Planeta Vermelho. A sonda Hope - que fez dos Emirados Árabes Unidos o primeiro país árabe a ir tão longe, numa missão em parceria com a Nasa –, vai explorar a atmosfera do planeta o circulando pelo período mínimo de um ano marciano (687 dias, para nós). A chinesa Tianwen-1 está em órbita e pretende fazer o pouso apenas em maio, com o objetivo de estudar geologicamente a superfície marciana e o solo logo abaixo dela. A Perseverance, dos EUA, já aterrissou com sucesso, para júbilo de todos a valorizarem devidamente o conhecimento científico e suas inúmeras contribuições para a melhoria da qualidade da vida humana. É meu caso. 

Há muito tempo que Marte se tornou terreno fértil para a ficção, inspirando ótimos enredos para filmes cujos gêneros transitam de comédias a dramas. Porém, o negócio aqui são as séries e há uma que se adequa perfeitamente ao contexto vitorioso da Ciência terráquea neste fevereiro – Away (Distante ou Longe, em português).  Em síntese, a história apresenta desafios da primeira missão tripulada ao Planeta Vermelho, ou seja, antecipa um caminho longo, porém factível, foco de obstinados estudos científicos em vários países no mundo real, que têm propósito e grana para embarcar no que soa a muitos como uma sangria de recursos públicos. Humildemente, prefiro o investimento na ciência astronáutica do que na indústria armamentista, para citar apenas um exemplo de prioridades que não me fazem sentido. A pergunta não é se a espécie humana vai pisar em Marte, os fatos atestam que há enorme probabilidade disso acontecer. As incógnitas residem no quando – se num futuro mais breve ou mais longínquo – e na motivação: será uma chance de sobrevivência para nós ou exclusivamente um propósito de exploração científica?

Admito que fiquei em dúvida quanto à pertinência de sugerir Away. Não pelo meu gosto, plenamente contemplado. Mas se trata de uma série original Netflix e a empresa não teve a menor cerimônia em a cancelar, isso no mês seguinte ao lançamento, em setembro passado. A alegação foi a usual: o interesse dos assinantes do streaming pela primeira temporada não teria justificado os custos de produção. No entanto, Away passou várias semanas no top 10 do ranking de audiência da Nielsen – instituto de pesquisa que, nos EUA, equivale ao que o Ibope já foi por aqui.  

A grita contra a decisão da Netflix ecoou por todo lado, porém em nível insuficiente para revertê-la. Mesmo sob impacto de certa frustração, do “quero mais” inalcançável, os dez episódios da primeira e única temporada de Away me valeram muito a pena, motivo pelo qual prossigo. Se você chegou até aqui torcendo o nariz, a princípio sem identificação com ficções espaciais, digamos assim, zero problema. Mas me agrada propor vislumbres que detonem a tal “zona de conforto”.  Meu argumento central é que Away não se reduz a nenhum rótulo. Para começar, quem interpreta a protagonista, a comandante Emma Green, é Hilary Swank, que já levou para casa dois Oscar na categoria Melhor Atriz, por sua atuação em dois excelentes filmes: “Boys dont´t cry” (Meninos não choram), em que dá um show como um rapaz transexual, e “Million Dollar Baby” (Menina de ouro), em outro especialíssimo papel, desta vez uma lutadora de boxe. Em geral, cuido de assistir tudo o que ela faz. 

Para mim, um bônus: o marido da comandante Green, Matt Logan, parceirão inclusive profissionalmente, já que colega dela na Nasa, é interpretado pelo ótimo ator Josh Charles, um “pedaço de mau caminho” que, na série “The good wife”, tem tórridas cenas com a personagem título. Destaque-se que o cientista Matt chega junto plenamente na criação da filha de ambos, adolescente, de quem a comandante Emma se despede com muito amor e culpa, para sua viagem longa e de volta improvável.

Além de Josh Charles, em Away, contracena com Hilary um elenco muitíssimo afiado, sobretudo os outros quatro tripulantes da nave que ela comanda, Atlas, que inclui mais uma mulher e três homens. O fato é que, como já dito, a história não se limita a retratar uma inédita missão tripulada a Marte. É isso também, claro. Mas o cerne do enredo reside nos desafios da convivência humana, levados ao extremo pelo confinamento de cinco astronautas em uma nave, para uma viagem de três anos. E, obviamente, problemas acontecem – desde falhas técnicas a momentos de quebra de hierarquia.  Para piorar, se juntam pessoas de nacionalidades e culturas diferentes, cumprindo a premissa da parceria tecnológica entre vários países. E haja coração para dar conta de algumas cenas super tensas, daquelas que te levam a deixar a respiração em suspenso. Mesmo com alguns furos inexplicáveis, a exemplo de incluir, nessa proposta histórica para a humanidade, um astronauta que nela faria sua primeira experiência no espaço, Away é cativante em todos os sentidos. 

Passemos à segunda sugestão, que faz parte da minha infância, dona dos meus afetos até hoje – Star Trek (Jornada nas Estrelas). Se a gente fala de viagem espacial, impossível deixar de citá-la, como uma precursora na ficção do gênero, inclusive antecipando um monte de tecnologias que vieram a se concretizar no futuro. Fora isso, a série original – sucederam-se várias adaptações – está na Netflix já há bastante tempo e quem quiser conferir precisa vê-la ou revê-la logo, sob risco de perder o barco. 

Ai, até me emociona... Final dos anos 70, a cada dia útil, no horário de 16h30, lá estava eu ligada na TV Tupi, para conferir aquela série incrível, capaz de até hoje manter universos de fãs – sem trocadilho – desde o seu lançamento nos EUA em 1966. Para resumir o enredo, nada melhor que o texto de abertura: “Espaço, a fronteira final. Estas são as viagens da nave estelar Enterprise, em sua missão de cinco anos para a exploração de novos mundos, para pesquisar novas vidas, novas civilizações, audaciosamente indo onde nenhum homem jamais esteve!”. E aí vinha aquele tema incidental capaz de ainda ser cantarolado por muita gente – eu incluída. 

A espécie humana aprendeu a lidar com as dobras espaciais e transitava por várias galáxias como membro da chamada Frota Estelar, da qual fazia parte também um rol variado de alienígenas, alguns bem estranhos e divertidos. Essa armada pacífica se reportava à Federação Unida dos Planetas e a busca geral era por conhecimento, pautado sobretudo na troca de experiências, embora vez por outra surgisse alguma nota destoante. 

Eu achava o capitão Kirk o homem mais lindo e inteligente nascido na nossa Terra. O ator que o interpretou – o glorioso William Shatner – por décadas ganha a vida associado ao personagem. Dublou o próprio na série de animação de Star Trek e, posteriormente, em vários videogames, além de ter protagonizado os sete primeiros filmes da franquia. 

Mas a turma trekkie (nomenclatura dos aficionados pela série) divide sua paixão com o primeiro oficial, braço direito do capitão, o instigante Spock, filho de pai vulcano e mãe humana. Essa circunstância faz com que eventualmente ele se veja dividido entre a pura lógica – marca dos vulcanos, assim como as orelhas pontudas – e algum resquício de emoção, coisa nossa. Seu intérprete, Leonard Nimoy, virou uma lenda. Falecido em 2015, aos 83 anos, ao menos teve oportunidade de fazer aparições muito especiais, como algumas na série “The Big Bang Theory”, já comentada aqui, para júbilo do grupo de nerds que forma o elenco central. Tenho um imã de geladeira com o doutor Spock fazendo o gesto da saudação vulcana (na foto), que significa “vida longa e próspera”. 

Agora, para muitas jovens daquele tempo, talvez a personagem mais marcante tenha sido a tenente Uhura, responsável por toda a comunicação da nave, interna e externa. Ela mexia sempre num monte de botões, em equipamentos que nos soavam o suprassumo da tecnologia, a tudo controlando de sua estação de trabalho, sentada com as belas coxas de fora. Sim, a tenente Uhura usava a microssaia comum a toda a tripulação feminina da série original. Essa peça estava no auge da moda nos anos 70 e a ninguém ocorreu que transformá-la em peça do fardamento da USS Enterprise seria uma sensualização imprópria daquelas trabalhadoras. O fato é que, apesar da presença rotineira de pernocas expostas, não me lembro de um só olhar desrespeitoso por parte dos colegas de viagem. Muito menos de qualquer comentário idiota por parte de algum deles.   

A atriz Nichelle Nichols fez de Uhura um legado. Sendo mulher e negra garantiu dupla representatividade em Star Trek original, chamada ao papel da tenente pelo próprio criador da série, Gene Roddenberry. Ao encerramento do programa nos EUA, em 1969, ela foi convidada a se tornar porta-voz da NASA. “Ajudei a recrutar e inspirar uma nova geração de astronautas destemidos; rapazes e moças com uma forte crença em si mesmos, em seu potencial e em um futuro de aprendizado e realização para toda a humanidade”, conta Nichelle em seu site pessoal, cujo endereço é uhura.com.

A comparação entre as sagas Star Trek (Jornada nas Estrelas) e Star Wars (Guerra nas Estrelas) – esta só de filmes, nunca foi série de TV – rende debates acalorados há décadas, e uma divertida rivalidade. Num site que coteja vários aspectos entre ambas – Observador.pt  – encontrei  uma definição hilariante: “Star Wars tem o sabre de luz; Star Trek tem o phaser, que é uma pistola que parece fruto do amor impossível entre um secador de viagem e uma serra tico-tico”. Ri demais, tudo bem, mas eu continuo trekkie

Nesses tempos de tanto desamor e intolerância, Star Trek cai muito bem, lembra que as formas de vida têm conexões invisíveis, talvez mais perceptíveis a quem prestar atenção. E levou o conceito de irmandade a outro nível, estabelecendo-o inclusive entre humanos e aliens. Valeu, Gene Roddenberry!

Despeço-me com uma frase de Marcel Proust, muito apropriada: “A verdadeira viagem de descoberta não consiste em ver novas paisagens, mas sim em ver com novos olhos”. 

Para maratonar:

Away – uma temporada, dez episódios, disponível na Netflix;

Star Trek original – três temporadas, total de 80 episódios, completa na Netflix.


 

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