A cessão temporária de útero x a barriga de aluguel | Direito de Família | F5 News - Sergipe Atualizado

A cessão temporária de útero x a barriga de aluguel
Blogs e Colunas | Direito de Família 28/07/2022 08h36 - Atualizado em 28/07/2022 12h53

O cenário trágico da guerra na Ucrânia acabou trazendo à tona a discussão sobre o procedimento da Barriga de aluguel. Por isso trago hoje para vocês um tema desconhecido e que muitos nem sabem que é permitido no Brasil: A Cessão temporária de útero ou também chamada de Barriga Solidária ou Gestação de Substituição. Mas, antes de trazer a definição desse procedimento, quero deixar bem claro que a Barriga de aluguel não pode ser confundida com a Cessão temporária de útero. 

A Cessão Temporária de Útero e a Barriga de aluguel são institutos muito parecidos e que confundem muito as pessoas fazendo-as acharem que ambos são o mesmo mas, não os são, pois a principal diferença entre eles está no recebimento em espécie pela realização do procedimento, no caso a barriga de aluguel. Já, em relação ao nosso tema em questão, a Cessão temporária de útero, não pode existir nenhum valor a ser recebido pela mulher doadora do útero pois deverá ser totalmente solidário. Resumindo, a Cessão temporária de útero é a “barriga de aluguel” que é permitida no Brasil.

Assim, tanto na Cessão Temporária de Útero como na barriga de aluguel serão utilizadas as técnicas de Reprodução assistida em um útero cedido por uma mulher para realização da gestação de casais inférteis, hetero ou homoafetivos ou de pessoa solteira.  Na Cessão temporária de útero a forma é solidária e na barriga de aluguel como o próprio nome diz, é um procedimento de alugar o útero para a gestação de um bebê, sendo assim, legalizada em vários países como; Estados Unidos, Índia, Tailândia, Ucrânia, México entre outros menos aqui no Brasil. O contrato de uma Barriga de Aluguel nos EUA pode custar até US$ 120 mil dólares (R$ 607 mil reais), já na Ucrânia, esse valor gira em torno de US$ 55 mil dólares (R$ 280 mil reais). Por isso que muitos casais optam por realizar o procedimento, da barriga de aluguel, na Ucrânia.

No Brasil, infelizmente, não há uma lei própria sobre o tema da Cessão temporária de útero e nem sobre a Reprodução assistida. O que existe são resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM) e um provimento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No Brasil, o nome Barriga de Aluguel nem deve ser confundido com a Cessão temporária de útero, justamente porque o ponto central da Resolução 2.294/2021 , do CFM, diz que “a Doação Temporária do Útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial”. 

A resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) ao tratar da Cessão Temporária do Útero, menciona que clínicas, centros ou serviços de reprodução assistida podem usar técnicas de Reprodução Assistida, desde que exista um problema de saúde que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética ou em caso de união homoafetiva ou pessoa solteira. Um dos critérios que devem ser observados é que as doadoras temporárias do útero devem ter ao menos um filho vivo e pertencer à família de um dos parceiros em parentesco consanguíneo até o quarto grau. Isso significa dizer que, só podem ceder a barriga solidária as mães (primeiro grau), irmãs ou avós (segundo grau), tias (terceiro grau) e primas (quarto grau).

Além de não existir uma legislação própria para a cessão temporária de útero e para a reprodução assistida ainda está explicito, claramente, no capítulo IX, na disposição final da Resolução do CFM o seguinte: “Casos de exceção não previstos nesta resolução dependerão da autorização do Conselho Regional de Medicina da jurisdição e, em grau recursal, do Conselho Federal de Medicina”. Situação que deixa a autorização ou não, dos procedimentos, totalmente nas mãos do CFM gerando uma instabilidade legislativa e causando enormes discussões sobre a falta de segurança jurídica do dispositivo por não haver uma legislação própria.

Também observamos que a obrigatoriedade de a doadora temporária do útero ser parente de até o quarto grau, encontrada na resolução do CFM, foi norteada na lei de transplantes (Lei 9.434/1997) que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e na Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005).

A legislação de transplante diz em seu artigo 9º que “é permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuges ou parentes consanguíneos até o quarto grau”, podendo ser responsabilizados criminalmente pelo aluguel da barriga tanto quem paga quanto a própria gestante. Também não é permitido que os óvulos da gestante que doará a Barriga por Substituição sejam utilizados para a fertilização. Isso para evitar que futuramente a cedente venha a questionar a maternidade da criança por ela gestada.

Logo, o procedimento de reprodução assistida que consiste no uso da barriga solidária, orienta que os futuros pais forneçam o material genético necessário (espermatozoides e óvulos), que serão fertilizados in vitro e, posteriormente, implantados no útero da mulher que o cederá temporariamente para a gestação. Mas, no caso de casais homoafetivos, pela inexistência de um dos dois materiais necessários exigidos, o procedimento é necessariamente diferente. Se o casal for composto por duas mulheres, será necessário recorrer a um banco de sêmen para a fertilização in vitro. Já no caso de casais do sexo masculino, haverá a necessidade de encontrar uma doadora de óvulos. Nesta situação, a doadora deverá, obrigatoriamente, ser anônima, não podendo ser parente e, ao mesmo tempo, ser voluntária, uma situação extremamente difícil e de grande altruísmo pois não existem banco de óvulos como os de sêmen, tendo a doadora que doar voluntariamente e passar por um tratamento hormonal de indução ovariana para depois serem retirados os óvulos para a realização da Fertilização in vitro. O procedimento então, não é igualitário e proporcional a todos os tipos de famílias.

Portanto, a falta de uma legislação específica tanto em relação a Cessão temporária de útero como na reprodução assistida gera inúmeras discussões e instabilidade jurídica aos dois procedimentos. Todos nós presenciamos o sofrimento de diversas famílias brasileiras que recorreram a Barriga de Aluguel na Ucrânia e todo o sofrimento que passaram principalmente por não conseguirem uma doadora dentro da família ou nem estarem no rol exemplificativo da Resolução 2.294/2021 do CFM. 

Mais Notícias de Direito de Família
Freepik/ilustrativa
24/04/2023  13h15 A importância da Constelação Familiar para o Direito de Família e Sucessões
fonte: vecteezy_couple-holding-hands-at-sunset_2004225
24/01/2023  07h00 É Namoro Qualificado ou União Estável? Saiba diferenciá-los
Pixabay/Ilustrativa
01/09/2022  14h00 A adoção direta é crime?

Blogs e Colunas
Direito de Família
Direito de Família

O direito é muito mais que a aplicação da “letra fria da lei” ou simples aplicação das normas inflexíveis que regem a sociedade. A partir de agora, os leitores do F5News passam a contar com uma coluna sobre Direito de Família. Os artigos serão assinados pela advogada Ana Paula Araújo.

O Direito de Família e o das Sucessões têm oferecido muitos desafios para os aplicadores de Direito em geral, alcançando uma abrangência teórica e prática que não existia até um passado próximo. Desde 2021, essa é uma área que recebeu novidades normativas e legislativas, decisões inéditas e mudanças no âmbito jurisdicional. Este espaço tem como norte a democratização do entendimento da área por meio da conexão dos temas jurídicos com o cotidiano.

Nesse sentido, a especialista vai oferecer a sua sólida formação e experiência para tratar de temas que interessam aos leitores, visando gerar um conhecimento capaz de fazer com que possam melhor identificar os problemas e tenham a orientação sobre como buscar a melhor forma de solução. Afinal, ao se tratar de questões familiares e patrimoniais, é preciso ter um olhar mais humano. 

Ana Paula Soares Mota Araújo é Advogada, Consultora jurídica e Palestrante, atuante no Direito de família e Sucessões e no Estatuto da Criança e do Adolescente, Especialista em Direito Civil e Processo Civil. Tem Formação Política pelo RenovaBR. Atualmente é Membro da Comissão de Direito de Família e Sucessões e da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB/SE. É membro do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família). Tem formação em Mediação Extrajudicial pelo ISAM (Instituto Sergipano de Arbitragem e Mediação) e é Co-fundadora do Projeto Acalanto Sergipe - Associação sem fins lucrativos que atua como grupo de apoio a adoção de crianças e adolescentes no Estado de Sergipe.

E-mail: anapaulaaraujoadvocacia@gmail.com

O conteúdo e opiniões expressas neste espaço são de responsabilidade exclusiva do seu autor e não representam a opinião deste site.

F5 News Copyright © 2010-2024 F5 News - Sergipe Atualizado