Como a queda de passageiros e a falta de subsídios ameaçam o transporte coletivo? | F5 News - Sergipe Atualizado

Grande Aracaju
Como a queda de passageiros e a falta de subsídios ameaçam o transporte coletivo?
Sem contrapartida, setor vê o aumento dos custos comprometer a capacidade de investimentos
Cotidiano | Por Will Rodriguez 17/01/2020 06h32 - Atualizado em 17/01/2020 10h44


Se deslocar de um ponto a outro utilizando o sistema de transporte integrado atualmente custa R$ 4 para quem vive na Região Metropolitana de Aracaju. A tarifa, sem reajuste há 13 meses, é considerada cara pelos passageiros. E, se por um lado, pesa no orçamento familiar, também tem deixado apertadas as finanças das empresas do setor, que veem ameaçada a capacidade de investimento, uma vez que todos os custos ainda são cobertos exclusivamente pelas passagens. 

É preciso uma verdadeira engrenagem para fazer os 570 ônibus da frota rodarem todos os dias, que inclui cerca de 3,5 mil colaboradores. Anualmente, o Setransp encaminha uma planilha de custos dos itens da operação que serve de parâmetro para definição da tarifa. A do ano passado foi enviada à SMTT, que se resume a dizer que só deve tratar da questão até o final deste ano. 

Os dois órgãos fazem mistério quanto ao valor ideal calculado. Em dezembro de 2018, quando da última revisão, a tarifa sugerida pelas empresas foi de R$ 4,44. Além da passagem defasada, o setor precisa lidar com a debandada de clientes. Em meia década, um terço dos passageiros desceu dos ônibus, mas não voltou. Hoje, eles somam pouco mais de 175 mil diariamente. 

“O transporte coletivo já transportou há alguns anos 300 mil pessoas por dia e hoje são 175 mil . No início, houve uma associação dessa queda com a redução de postos de trabalho em 2013, mas essa realidade vem sendo mudada e o setor de transporte não tem acompanhado porque, em contrapartida, aumentou o número de veículos particulares e, principalmente, de transportes clandestinos. Nesta última década, houve um acréscimo de 57% no total de automóveis nas vias de Aracaju e da Grande Aracaju. Porém, o ônibus consegue transportar dez vezes mais pessoas na mesma via em uma hora do que carros e motos, ou seja, o benefício para a mobilidade urbana se concretiza quando o transporte coletivo é priorizado”, afirma a superintendente do Setransp, Raissa Cruz. 

A menor demanda por coletivos coincide com a chegada dos aplicativos de transporte. Um estudo da Universidade de São Paulo revelou que, em média, seis em cada dez usuários de aplicativos migraram do transporte público. Mas a falta de regulação desse modelo alternativo serve de alerta considerando que, conforme Raissa, o transporte clandestino não passa pelas normas legais de segurança do veículo e do seu condutor, não é tributado, nem oferece serviço em áreas não comerciais, nem as gratuidades, nem faz parte do planejamento urbano para contribuição com a mobilidade urbana. 

As empresas de ônibus alegam que a opção compartilhada configura transporte coletivo irregular e já acionaram o poder público em 15 cidades do país para tentar barrá-la, argumentando ainda que empresas de aplicativo contribuem menos com a manutenção da infraestrutura urbana. As operadoras discordam e sustentam que o serviço foi criado para colocar mais pessoas em menos carros e que ele "complementa o transporte público, ampliando o acesso dos usuários à rede pública".

Segundo a superintendente, quem também pega carona nessa conta são os usuários com direito à gratuidade. Desde 2014, o número de pessoas que não pagam pelo serviço cresceu 80%, mas nenhum movimento - além dos aumentos da passagem - foi feito no sentido de cobrir essa obrigação. A falta de subsídios é apontada como um entrave.

“As maiores despesas para operação do serviço são mão-de-obra e combustível, que representam 64,89% dos custos da tarifa. Nacionalmente, o setor de transporte tem buscado desonerar os custos, como no caso do diesel, que em muitas capitais é livre de imposto, sendo para o transporte público coletivo o valor diferenciado daquele pago no transporte particular”, observa Raissa Cruz.

Procurada pelo F5 News, a Secretaria da Fazenda do Estado disse não ter nenhuma tratativa no sentido de alterações da política fiscal do ICMS aplicada sobre o diesel para o setor em curto e médio prazos.

Já o secretário das Finanças de Aracaju, Jeferson Passos, ponderou que a expectativa em torno da Reforma Tributária, em discussão no Congresso Nacional, inviabiliza medidas dessa natureza. O impacto do ISS no preço da passagem é de 2%. 

“No momento, não há nenhuma discussão sobre desoneração do ISS para nenhum segmento da atividade econômica, até porque, por conta do que está sendo discutido sobre a Reforma Tributária, existe a possibilidade de que o ISS deixe de ser competência do Município. Como todos estão receosos em perder essa fonte de receita tão importante, seria temerário aplicar isenções agora”, salienta Passos.

Taxar o transporte individual, tornar mais caro o serviço prestado por aplicativos, receitas das prefeituras e recursos da exploração de estacionamentos públicos e privados são algumas propostas de representantes do segmento para aliviar o bolso dos passageiros em todo o país. 

“Seria uma boa medida se mudássemos a política tarifária adotada no Brasil, criando a subvenção. Assim, estaremos fazendo o que o resto do mundo faz. Onde tem transporte público de qualidade, a tarifa é paga por todas as pessoas que usam e as que não usam o sistema”, apontou Otávio Cunha, presidente-executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), durante audiência pública no Senado, em setembro passado. 

Uma análise do Ipea observa que o estímulo aos deslocamentos por meio do transporte individual, associado ao encarecimento do transporte coletivo, é responsável pela deterioração da mobilidade urbana nas grandes cidades e todas as suas consequências, como “congestionamentos, poluição, acidentes de trânsito e até reforço da exclusão social para aqueles que não podem adquirir um veículo privado e veem o transporte público perdendo qualidade e ficando cada vez mais caro”.

Em Aracaju, o Setransp vê com bons olhos projetos da Prefeitura no sentido de abrir corredores específicos para os ônibus nas avenidas Rio de Janeiro e Hermes Fontes. Mais além, considera a faixa exclusiva o elemento mais eficiente e barato para se alcançar a priorização do transporte coletivo, prevista no Plano Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU). 

“A ausência da prioridade aos ônibus gera implicações para o tráfego não somente do coletivo, mas em geral. Na capital, quando as faixas exclusivas ou prioritárias são utilizadas à risca, com fiscalização, é constatada a redução no tempo de viagem de em média 20 minutos nos deslocamentos dos ônibus; isso gera agilidade para o transporte da maioria da população e, por tabela, o interesse das pessoas em priorizar o coletivo ao invés do transporte particular aumenta, contribuindo para a mobilidade de todos nas vias”, diz Cruz.

Pé no Freio 

Além da infraestrutura de vias e terminais, a qualidade do transporte coletivo é fortemente influenciada pelas condições da viagem em si, na avaliação dos passageiros. Na Grande Aracaju, as empresas apostaram na bilhetagem eletrônica e outros itens de tecnologia embarcada, como o GPS, o Anjo da Guarda e as câmeras de segurança, para proporcionar uma experiência mais satisfatória. 

O investimento de R$ 16 milhões no sistema dos cartões Mais Aracaju desde a sua implantação em 2007, por exemplo, levou à redução gradual da circulação de dinheiro em espécie nos carros, inibindo a ação de criminosos, o que hoje resulta numa retração superior a 80% nas ocorrências criminais desde 2016, conforme dados do Setransp. 

Mas continuar a aportar recursos para aperfeiçoar o serviço é uma meta que, segundo o setor, está ameaçada pela inexistência de perspectivas concretas quanto às soluções para as demandas de custeio.

Edição de texto: Monica Pinto
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